segunda-feira, 22 de agosto de 2011

vidas erradas

Há pouco fui ao supermercado e passei, como habitualmente, por um sem-abrigo que há muitos meses se instalou junto à porta de acesso ao parque exterior. Enquanto caminhava ouvi o tipo duma carrinha de distribuição afirmar, mais do que perguntar: “Tu, com essa vida, nem miúdas sacas”. O sem-abrigo que terá pouco mais de 30 anos - suspeito que lavadinho e com roupa catita punha muitos tipos a um canto - replicou-lhe calmamente: “Por acaso ainda na semana passada estive com uma. Tu devias estar a ver bola enquanto eu estava na brincadeira com ela”. O outro, de pança farta, querendo ter a última palavra: “Ah sim? E debaixo de que ponte?”. Já não ouvi a resposta. Quando saí, já o pançudo tinha isso à sua vida (arrisco-me a dizer vidinha) e o outro, o sem-abrigo, contava a sua estória a uma pequena plateia de mulheres e crianças. Fui andando devagar e percebi que o divórcio dos pais o tinha atirado para as estatísticas das crianças que ninguém quer. E assim foi crescendo, entregue à sua sorte e fazendo por sobreviver. Agora está ali. Nunca o vi pedir nada a ninguém, nunca o vi ser mal-educado e tem ainda nos olhos um brilho que a vida não lhe conseguiu apagar.
Fiquei a pensar que é preciso tão pouco para uma vida dar errado. Estamos sempre muito mais perto do precipício do que aquilo que imaginamos. Uma opção mal tomada, um passo em falso, um desaire amoroso, qualquer coisa. O facto é que todos temos em nós a possibilidade do abismo.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

(sobre)VIVER

Nos últimos tempos tenho ouvido muita gente responder à questão o que espera do futuro? com um simples sobreviver. Muitas dessas pessoas não estão doentes, não têm dificuldades económicas e, ainda assim, só esperam sobreviver. Ou o meu conceito está errado ou as pessoas esperam muito pouco da vida. Mesmo em plena crise económica, que também sinto na pele, ainda espero muito mais do que simplesmente sobreviver. É verdade que exercer o meu direito à futilidade (que em mim é mais uma vocação), desgraçando-me em sapatos e roupitas, se poderá tornar mais complicado mas, frivolidades à parte, há tanta vida para viver, tantas coisas que se podem fazer sem se gastar muito dinheiro. Ainda por cima as coisas que realmente importam não se compram. Se estivesse muito doente, então sim, desejaria com todas as forças sobreviver. Estando bem de saúde, quero mesmo é viver, muito!

há palavras que só os beijos calam

Acordei devagarinho com a luz suave da manhã a acariciar-me a pele e o cheiro a maresia a inundar-me os sentidos. Libertei-me lentamente dos braços dele e olhei em volta. Em frente tinha o imenso mar azul, plácido e apetecível. As gaivotas piavam no alvoroço de terem a praia por sua conta. Fechei os olhos e, por momentos, voltei ao céu estrelado da noite anterior. Estrelas, milhões delas, testemunhas mudas do prazer que partilhámos, testemunhas mudas de tantas estórias.
Ele acordou. Sorriu e beijou-me com olhos de desejo. Ainda tentei argumentar que a qualquer momento chegariam os primeiros madrugadores à praia mas... há resistências que só o desejo vence e há palavras que só os beijos calam.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

nada a acrescentar

"Ama-se aquilo com que se cruza, mulher, paisagem, caminho, ou porque evoca emoções sabidas ou porque é novo e vem casar com a busca com o que se adivinha e é pressentido a sós, e é só talvez assim."

sábado, 6 de agosto de 2011

Kronos e Kairós

"O passar do tempo goza com o género humano. Bem faziam os gregos diferenciando entre o Kronos, o simples passar dos segundos, e a incidência que determinados instantes teriam na nossa vida, fazendo dilatar essa medida de tempo e dotando-a de relevância, o Kairós."

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

sempre mais


Deixo pedaços de mim por todos os sítios onde passo, com todos os amigos que amo, a todos os amantes que tenho. Partilho-me e tenho cada vez mais, sempre acrescentada de tudo o que dou e de tudo o que vivo…