quarta-feira, 29 de junho de 2011

acidentes mediáticos

A propósito de acidentes, muito se tem escrito na blogoesfera sobre o Angélico. Há quem o condene de imediato porque devia ir em excesso de velocidade, porque devia ir com os copos, porque não levava cinto, porque jovens como ele são todos uns inconscientes por colocarem a sua vida e a dos outros em perigo. Há quem o defenda e sofra como se, pelo facto de ser conhecido, fizesse parte da família ou dos amigos. Os Portugueses são exímios em expressar juízos de valor quer estejam ou não na posse de toda a informação sobre qualquer assunto que seja.
Eu apenas lamento uma morte tão prematura, como lamento todas. Não sei o que provocou o acidente. E ainda que tenha sido por algum dos motivos referidos acima, quantos podem dizer que, em algum momento das suas vidas, não facilitaram? Eu não posso. Da mesma maneira que me recusei muitas vezes a ir num carro com um condutor embriagado, ou que convenci alguém a deixar-me conduzir por não ter bebido, também já andei de carro com amigos que conduziam embriagados, andei sem cinto, fui fazer piões de jeep, andei em carros ultra lotados, andei a 280 de mota e, uma ou outra vez, conduzi ligeiramente embriagada. Era mais nova, é certo, mas mesmo assim com idade suficiente para ter consciência do que estava a fazer. Tive sorte, muita sorte porque há, efectivamente, idades em que nos achamos imortais. Também me impressiona todo este circo mediático montado à volta deste acontecimento. Como se ele fosse o único a sofrer uma morte destas. Era, de facto, único para a sua família e amigos. Ele perdeu a vida e os que o amam ganharam um inferno particular que só o tempo irá amenizar.

circular é morrer?

Morre-se muito nas estradas portuguesas, sendo diversos e distintos os factores que contribuem para este grave problema nacional. A grande maioria dos acidentes rodoviários são provocados por erro humano, nomeadamente por velocidade excessiva, manobras perigosas, condução sob efeito de álcool ou drogas, falta de civismo, entre outros. A não utilização dos sistemas de segurança obrigatórios (cintos, capacetes, cadeiras infantis) é um outro factor que faz aumentar exponencialmente o número de vítimas mortais em sinistros rodoviários. Há, no entanto, acidentes que têm a sua origem no mau estado ou má concepção das estradas e na sua deficiente ou inexistente sinalização. Não será pois justo imputar as culpas dos números negros de acidentes rodoviários somente aos condutores, cabendo-lhes, no entanto, a fatia mais grossa de responsabilidade. A actuação dos organismos competentes deveria pautar-se por um desempenho muito diverso do que tem vindo a ser feito, não se demitindo das suas responsabilidades e fazendo campanhas adequadas e agressivas, que mostrem, brutalmente e sem rodeios, os efeitos nefastos dos acidentes. As multas podem influenciar o comportamento de alguns condutores, mas não são suficientes para mudar toda uma cultura de condução (mal) implementada, devendo a punição para pessoas condenadas criminalmente neste cenário, passar pelo trabalho cívico com sobreviventes mutilados de acidentes. É difícil mudar mentalidades e hábitos (mal) adquiridos mas, tendo em conta os benefícios que poderiam ocorrer ao serem postas em prática algumas medidas mais agressivas, certamente valerá a pena o esforço.

terça-feira, 28 de junho de 2011

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Às vezes tudo muda nos breves segundos de um olhar fortuito...

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Não quero ter o tempo todo completamente ocupado. Quero deixar espaço para o não planeado, para me deixar surpreender, para mudanças, para me perder, para me reencontrar...
No fundo eu quero o MUNDO e quero continuar inebriada pela vida, espantada com ela, arriscaria mesmo dizer FELIZ porque sim! Não é nada palpável, não é nada especial. Simplesmente sinto-me bem, com o coração em paz, sem mágoas e com vontade de viver muito.

de um tempo que já passou...

dormi contigo a noite inteira junto do mar, na ilha.
selvagem e doce eras entre o prazer e o sono,
entre o
FOGO e a água.

talvez bem tarde nossos
sonos se uniram na altura e no fundo,
em cima como ramos que um mesmo vento move,
embaixo como raízes vermelhas que se tocam.

talvez teu sono se separou do meu e pelo mar escuro
me procurava como antes, quando nem existias,
quando sem te enxergar naveguei a teu lado
e teus olhos buscavam o que agora - pão,
VINHO, amor e cólera - te dou, cheias as mãos,
porque tu és a
TAÇA que só esperava
os dons da minha vida.

dormi junto contigo a noite inteira,
enquanto a escura terra gira com vivos e com mortos,
de repente desperto e no meio da sombra meu braço
rodeava tua cintura.

nem a noite nem o sonho puderam separar-nos.
dormi contigo, amor, despertei, e tua boca
saída de teu sono me deu o sabor da terra,
de água-marinha, de algas, de tua íntima vida,
e recebi teu
BEIJO molhado pela aurora
como se me chegasse do mar que nos rodeia. 
 

domingo, 26 de junho de 2011

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Lovers have a religion and a faith of their own...

ir além do desespero

A sala de espera era exígua. Sentada numa cadeira desconfortável, fechei os olhos tentando abstrair-me da cacofonia geral. Queria não pensar, estar em branco, em silêncio, mas a algazarra não deixava que a minha alma se apartasse para um lugar sossegado. A desesperança tinha-me entrado na alma e eu não sentia forças para a combater. Abri os olhos. Na cadeira à minha frente uma velhota pequenina, aparentando uma idade impossível, dormitava. Mesmo repousando, ou talvez por isso, parecia transmitir uma aura de paz, de sossego. Mirei-a com atenção. Tinha os cabelos muito brancos e muito ralos. O rosto engelhado, sulcado por rugas profundas e pequenas cicatrizes, deixava adivinhar uma vida dura. As mãos calejadas aninhadas no regaço mostravam, também elas, marcas da idade e de uma vida de trabalhos pesados. Quando olhei de novo o seu rosto, um espanto indizível tomou conta de mim. Os seus olhos, belos, meigos, serenos, cheios de luz, eram a total antítese do seu corpo.
“Sente-se bem, minha filha?”, perguntou com um leve sorriso.
“Acho que sim” respondi hipnotizada pelo seu olhar vibrante e transbordante de ternura.
Olhou-me enigmaticamente. “Não está bem. Tem na alma uma tristeza sem fim, um abandono, uma dor profunda, uma queda iminente e fatal”.
Queria poder chorar, mas as lágrimas tinham secado. Esforcei-me por sorrir. Os seus olhos têm uma luz quente, têm um brilho especial e, no entanto, tem já tanta idade e parece ter sofrido na pele todas as amarguras do mundo.
Sorrindo, “É verdade, padeço de todos os males. Nenhum, contudo, me derruba. Chamo-me Esperança, e a menina?”
Nisto um miúdo tropeçou em mim e num impulso segurei-o para que não caísse. Quando olhei de novo para a velhinha, a Esperança, já não a vi. Desaparecera. Olhei em volta, fui à porta, espreitei para a rua e nada.
Sentei-me de novo. Ter esperança não é fácil, é um caminho longo e sinuoso, é uma vitória sobre nós mesmos, sobre a vontade de desistir, a vontade de ficarmos cheios de pena de nós próprios. Ter esperança requer esforço e paciência. Para a alcançarmos precisamos de ir além do desespero.

terça-feira, 21 de junho de 2011

nunca são as coisas mais simples

Nunca são as coisas mais simples que aparecem
quando as esperamos. O que é mais simples,
como o amor, ou o mais evidente dos sorrisos, não se
encontra no curso previsível da vida. Porém, se
nos distraímos do calendário, ou se o acaso dos passos
nos empurrou para fora do caminho habitual,
então as coisas são outras. Nada do que se espera
transforma o que somos se não for isso:
um desvio no olhar; ou a mão que se demora
no teu ombro, forçando uma aproximação
dos lábios.

palavras

Gosto de palavras. Pronuncio-as, sinto-lhes o gosto, a textura. Com elas me perco tantas vezes e, de novo, por elas me encontro.
Há palavras que me seduzem infinitamente mais que outras. Numas, é o referente que me  agarra. Noutras é o modo como soam aos meus ouvidos: doces, ou melódicas, ou exóticas.

Estas são algumas. Assim, todas seguidas, lembram alguma espécie de ladainha invocatória:

morabeza, espuma, mar, estrela, volúpia, deuses, ousadia, sedução, estultícia, missanga, merengue, maracujá, diabo, devil, awesome, paixão, desamparinho, tertúlia, mentira, beijo, fogo, sangue, anjo, feitiço, sombra, vinho, louco, sedento, lábios, viajar, ilha, máscara, insólita, cacajuetes, inusitado, inebriado, sorvete, desvario, muqueca, jindungo, nau, baú, fera, sal, marejados, cadência, lento, carícia, pele, escarlate, sussurro, murmúrio, romã, boémia…

segunda-feira, 13 de junho de 2011

de todo, quedaron tres cosas




De todo, quedaron tres cosas:
la certeza de que estaba
siempre comenzando,
la certeza de que
había que seguir
...
y la certeza de que sería
interrumpido antes de terminar.

Hacer de la interrupción un camino nuevo,
hacer de la caída, un paso de danza,
del miedo, una escalera,
del sueño, un puente,
de la búsqueda...un encuentro.

pequenos nadas

Procuramos a felicidade como se esta fosse um porto de destino e não um modo de viajar. Partimos de um pressuposto errado. Andamos, como loucos, à procura de uma utopia: um estado de felicidade que uma vez atingido se manterá imutável. E nesta busca alucinada perdemos a viagem, perdemos o encanto das coisas simples e belas que fazem o nosso dia-a-dia. Não vivemos o momento, aquele momento simples e sem nada de especial. Só mais tarde percebemos que naquele instante fomos felizes.
A felicidade não tem segredos, não é uma demanda do "santo graal". Vivem-se momentos felizes feitos, tantas vezes, de pequemos nadas, de detalhes mínimos, de palavras doces, de sentimentos que nos enchem a alma, de gestos de carinho. Importante é percebermos que estamos felizes naquela hora, naquele instante. Importante é sermos felizes no presente e não no passado.